quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Sei que não há como convencê-la de que isto não é um truque, mas não faz mal. Sou eu. Meu nome é Valerie. Não creio que viverei muito tempo e quero falar sobre a minha vida. Esta é a única biografia que eu vou escrever, e deus, estou escrevendo-a em papel higiênico.

Nasci em Nottingham, em 1985. Não me lembro muito da infância, mas eu me lembro da chuva. Minha avó tinha uma fazenda em Tuttlebrook e dizia-me que Deus estava na chuva. Fui aprovada no exame para o curso secundário; foi na escola que conheci minha primeira namorada, seu nome era Sarah. Foram seus pulsos. Eles eram lindos. Achei que nos amaríamos para sempre. Lembro-me de nosso professor dizendo-nos que era uma fase da adolescência que superaríamos. Sarah superou. Eu não.

Em 2002, eu me apaixonei por uma garota chamada Christina. Naquele ano, contei aos meu pais. Não poderia ter feito isso sem a Chris segurando minha mão. Meu pai não olhou para mim. Disse-me para ir embora e nunca mais voltar. Minha mãe não falou nada. Mas eu só contei a verdade a eles, isso foi egoísmo demais? Nossa integridade vale tão pouco, mas é tudo o que realmente temos. É a parte mais importante de nosso ser. Com ela, somos livres.

Sempre soube o que queria da vida e, em 2015, eu estrelei meu primeiro filme: As Dunas de Sal. Foi o papel mais importante da minha vida, não pela carreira, mas porque assim conheci a Ruth. Na primeira vez em que nos beijamos, eu soube que nunca mais iria querer beijar outros lábios. Nós nos mudamos para um pequeno apartamento em Londres. Ela cultivou Scarlet Carsons para mim na janela e nosso apartamento sempre cheirava a rosas. Foram os melhores anos da minha vida.

Mas a guerra dos EUA ficou pior, e pior... E, no fim, chegou a Londres. Depois disso, não houve mais rosas. Não para todos. Lembro-me de como o significado das palavras começou a mudar. Palavras pouco familiares como "colateral" e "rendição" inspiravam medo; enquanto coisas como "Fogo Nórdico" e "Os Artigos de Submissão" tornaram-se poderosas. Lembro-me de como "diferente" virou "perigoso". Eu ainda não entendo por que nos odeiam tanto. Eles levaram a Ruth enquanto ela estava fora comprando comida. Nunca chorei tanto na minha vida. Não demorou até que viessem para me buscar. Parece estranho que minha vida termine em um lugar tão horrível. Mas durante três anos eu tive rosas e não pedi desculpas a ninguém.

Eu morrerei aqui. Cada pedacinho do meu ser perecerá. Cada pedacinho... Exceto um. É pequeno e frágil, mas é a única coisa que vale a pena ter. Nós jamais devemos perdê-lo ou jogá-lo fora. Nós jamais devemos deixar que o tirem de nós.

Eu espero que, seja você quem for, escape daqui. Espero que o mundo mude e as coisas fiquem melhores. Mas o que eu espero, acima de tudo, é que você entenda o que quero dizer quando digo que mesmo que eu não te conheça e mesmo que talvez jamais conheça você, ria com você, chore com você, ou beije você... Eu amo você. De todo o meu coração... Eu amo você.

Valerie


Carta extraída do filme "V de Vingança", dirigido por James McTeigue.

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